Alexandre Pais

Um estado com vocação para palhaço

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Rui Pereira é um dos mais sérios, equilibrados e bem preparados comentadores da televisão – e está na CMTV. Mas foi uma pequena entrevista que deu ao jornal, há dias, que me alertou para uma situação que me passava ao lado e me deixou estarrecido. Logo a mim, que tenho a pretensão de achar que já nada me surpreende na vida.

Rui Pereira explicou-nos o que era o instituto da contumácia, uma espécie de perda de cidadania que se aplica quando uma pessoa “desaparece” para fugir à justiça. E no plano teórico tudo certo. O problema é o que nos traz a realidade, os mais de 15 mil (!) arguidos que não se encontram em parte alguma e que por isso não prestam contas. E que mesmo depois de julgados sem a sua presença e condenados – o que é possível, vá lá – não cumprem a pena porque, simplesmente, ninguém mexe uma palha para os meter na cadeia, se for o caso.

É o esplendor do país da impunidade, com o primado da lei a perder para o livre curso do seu desrespeito. E não seria um trabalho extraordinário: bastaria um discreto corpo policial cuja única missão fosse capturar os foragidos e colocá-los à frente de um juiz. Nada que interesse ao Estado e à sua chocante falta de autoridade – e vocação para palhaço.

Antena paranoica, Correio da Manhã, 24abr21

Por Alexandre Pais
Alexandre Pais

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