Tiago Fernandes, de cabeça fresca, viu de imediato o que nos parecia absurdo mas que José Peseiro teimava em ignorar: a qualidade de Acuña exangue no exílio da lateral. E ontem, em São Miguel, um rosto novo, uma mudança inteligente, uma energia recarregada e a atitude dos jogadores – sempre eles! – fizeram a diferença.
Para ser sincero, também me apetece defender José Peseiro, que em quatro meses no Sporting e perante circunstâncias particularmente difíceis cumpriu uma tarefa responsável e abnegada que merece elogios. Abandonado pela nova direção leonina – e até pelo “padrinho” Sousa Cintra – com o talento no plantel reduzido a 50 por cento e detestado por muitos adeptos que pedem a Lua, o treinador acabou, como se esperava, despedido, e como não se esperava de gente tão civilizada, afastado como um incompetente e um inútil. Deixo-lhe um aceno de simpatia, a vida continua.
Coisa diversa de apoiar Peseiro são as críticas ao direito de Frederico Varandas de tomar as decisões pelas quais só ele responderá. Afinal, o técnico dispensado veio do desemprego para o Sporting e teve mais uma oportunidade, ainda que difícil, penosa mesmo, de desenvolver o seu trabalho. E cometeu erros como aquele que o levou a mexer demasiado na equipa que escolheu para defrontar o Estoril. Fê-lo de forma suicida, após haver conseguido, frente ao Boavista, a melhor exibição da época e de ter perdido com o Arsenal de novo com a ajuda da fiel companheira que nunca lhe falha: a bruxa dos últimos minutos. Isso para deixarmos no esquecimento que o árbitro prejudicou claramente os leões na partida da Liga Europa, ao fazer vista grossa a uma falta para grande penalidade. Nada que tivesse excitado muito aquela “boa imprensa” que queria à viva força ver Paulo Sousa em Alvalade – ui… do que o Sporting se livrou!
O sucesso das empresas, no futebol ou fora dele, não se compadece com sentimentalismos, e Varandas fez bem em mudar de treinador se entende, e para isso foi eleito, que defende assim os interesses do Sporting. Apesar de ninguém, para além dele e do amigo dr. Araújo, estar a ver como poderá Marcel Keizer melhorar a situação de uma equipa que continua a competir, quase intacta, em quatro frentes, e que segue até, no campeonato, em terceiro lugar e com dois pontos de vantagem sobre o Benfica. A alegria dos cemitérios com que o holandês de Varandas será recebido em Lisboa prenuncia vaias sem fim ao presidente quando a bola não entrar – ele tinha em Peseiro, que não escolheu, um seguro de vida e rasgou-o – e recomenda a Tiago Fernandes que se mantenha atento: depois de ontem, já não é só o filho do maior “capitão” da história do Sporting.
E não foi o despedimento de Peseiro que motivou os assobios que esperavam nos Açores por Frederico Varandas. Ele precisará de grandes êxitos desportivos para esbater a imagem daquela figura veneradora que emergia como uma sombra do banco do Sporting, repetindo os gestos tantas vezes destemperados do querido líder – que viria mais tarde a abandonar. Nada lhe será perdoado, a memória é uma chatice.
O parágrafo final vai de novo para o ténis, hoje para destacar as três horas de sonho do último duelo entre Federer e Djokovic, nas meias-finais do Masters de Paris-Bercy, que o sérvio ganhou por 2-1, vencendo dois “tie-breaks”. Nole tornou a ser o número 1 da atualidade e voltou a confrontar-se com o melhor de sempre que, aos 37 anos, mantém o alto nível dos velhos tempos. Um dia, diremos destes embates o que já dizemos dos clássicos do Bernabéu e de Camp Nou, em que Cristiano e Messi emocionavam milhões de telespectadores pelo Mundo fora: desgraçadamente, não há mais.
Outra vez segunda-feira, Record, 5NOV18
O dia em que Acuña voltou do exílio
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