Alexandre Pais

Jorge Jesus, o homem do coração de aço

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A ingratidão é o maior sinal de falta de caráter e a solidariedade a caraterística que mais dignifica o ser humano. Por isso, o grande momento da final da Libertadores viveu-se antes do apito inicial, quando Enzo Pérez, hoje no River Plate, fez questão de atravessar o campo para abraçar Jorge Jesus, e este o beijou. Porque esse gesto teve um profundo significado. É que o médio argentino foi não só treinado pelo português, no Benfica, como participou nos dois jogos que – em cinco dias do negro maio de 2013 – podiam ter terminado com a carreira de Jesus: o do Dragão, com o golo fortuito de Kelvin, já nos descontos, que valeu um campeonato, e o do Arena de Amesterdão, com o golo de Ivanovic, aos 90+2, que deu a Liga Europa ao Chelsea. A forma como esse duro infortúnio duplo uniu para sempre o coração de dois homens – até na iminência de um confronto terrível – é uma lição de vida que o futebol dá aos seus adeptos e em especial aos seus detratores. Ah, sim, e depois houve uma final, empolgante, inesquecível.
Não vou fazer como aqueles que dizem agora que apostaram no talento de Jorge Jesus desde que foi júnior do Sporting. Fui mesmo um dos que chegaram a prever, nas semanas iniciais da sua aventura no Flamengo, que o ninho de lacraus do futebol do Rio de Janeiro o devolveria rapidamente à procedência. Foi um erro, sim, e viverei com ele. Mas sinto genuína incomodidade por um erro maior: o de não ter “acarditado” na força do bicho.
Entendamo-nos. Não foi pela indiscutível capacidade técnica de Jesus que estivemos pelo Fla com um fervor patriótico semelhante ao que nos suscita a Seleção Nacional. Foi, antes, por nos identificarmos com a pessoa que ele é. Com as suas origens, as dificuldades no Português, a comunicação peculiar e, principalmente, o caminho de “self made man” que percorreu com a determinação dos que nunca são vencidos. Mais: sentimo-lo um dos nossos por ter, ainda, resistido aos ventos da desfortuna que o convidavam a desistir. E seis anos e meio após ter caído de joelhos no Dragão e cinco e meio decorridos sobre a perda – frente ao Sevilha e nos penáltis! – da segunda final consecutiva da Liga Europa, o homem de coração de aço reencontrou, em três minutos caídos do céu no longínquo deserto de Lima, onde a escuridão já sorria, a estrelinha tão injustamente perdida. A sorte dá muito trabalho – e era tempo. Mestre e campeão: chapeau!
O último parágrafo vai para o tormento de Gonçalo Guedes em Valência. Quando parecia quase recuperado da lesão sofrida no Portugal-Ucrânia, de 14 de outubro, o clube anuncia “mais algumas semanas de paragem”, o que significa que o avançado não voltará tão cedo aos relvados. Aos 22 anos, o problema do tornozelo ameaça-lhe a carreira e os insucessos do Valência, décimo em La Liga, fazem com que já se dê a ausência de Guedes como uma das causas da temporada cinzenta do clube “che”. Que o pesadelo acabe!

Por Alexandre Pais
Alexandre Pais

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