Juiz algum responsabilizará um dia Donald Trump pelos crimes de ódio que se multiplicaram nos Estados Unidos desde a sua eleição e que atingem hoje proporções irracionais. Como em Portugal jamais se provará numa sala de tribunal – e confirmámo-lo não há muito tempo – a relação íntima que possa existir entre a palavra incendiária do intelectual hábil e a mão criminosa do bandido estúpido.
Vou repetir-me. Se vivemos num país em que há, e dou apenas exemplos, jornalistas que deturpam a verdade, polícias que assaltam e roubam, autarcas que são corrompidos e até juízes capazes de desonrar uma classe que é o último bastião de defesa da probidade e da decência, que mais se pode esperar do que encontrar também delinquentes no meio das pessoas de bem que integram as claques de futebol?
O problema é que as pessoas de bem não são úteis às direções dos clubes, ao contrário dos delinquentes da maioria das claques, que se deixam instrumentalizar em troca de bilhetes, viagens ou arrecadações para bebidas e outros produtos, sendo depois transformados por quem os comanda em guardas pretorianas – um eufemismo para associações criminosas.
São dessas mentes manipuladas as mãos armadas que ajudam a ganhar eleições, condicionam fisicamente os opositores – reais ou supostos – em assembleias gerais, ameaçam treinadores e jogadores que se querem ver partir, apedrejam carros e casas de árbitros, agridem e tentam matar, e matam, adeptos adversários – até ao dia em que, sem código de conduta que não seja o da própria marginalidade, se voltam mesmo contra aqueles que eram objeto do seu “amor” e da sua “proteção”, como sucedeu com o atentado ao autocarro do Benfica. Que têm então a ver com isso as direções dos clubes?
Nessa fase, obviamente, já nada, o que não nos impede de sublinhar a realidade: todas lamúrias, repúdios veementes, indignações dúbias ou exigências de “punições exemplares” não são mais – ainda uma vez e sempre – do que tentativas de tapar o sol com a peneira e alijar responsabilidades. Sim, os senhores são os verdadeiros culpados pela violência que envolve o desporto em Portugal. É vossa a mão que embala o berço.
Após ter sido dispensado por Lopetegui, no verão de 2015 – na sequência de uma época em que fez 43 jogos e marcou 10 golos pelo FC Porto – Ricardo Quaresma foi para a Turquia disputar 172 partidas e apontar 24 golos, e voltou à Seleção para ser campeão europeu e somar, entre 2016 e 2018, 35 jogos e 6 golos. Agora, aos 36 anos, este ícone do futebol quer regressar ao Dragão e terminar aí a sua carreira – como em boa hora foi permitido a Pepe. Aceitá-lo de novo é a única forma que Pinto da Costa tem de compensar a injustiça cometida pelo imbecil que aportou na Invicta a sua armada espanhola, com as funestas consequências que se conhecem. Chapeau, Cigano!
Parágrafo final para outro imortal, Fernando Gomes, o “bibota”, a quem deixo uma palavra de apoio e solidariedade face ao ataque repugnante de que foi alvo. Chapeau, lenda!
Outra vez segunda-feira, Record, 8jun20
De quem é a mão que embala o berço?
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