Alexandre Pais

Somos bons a chutar para canto!

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No meio das nossas muitas virtudes, tínhamos uma qualidade que nos distinguia e felizmente se mantém: a do desenrascanço. Nos últimos tempos, porém, conseguimos ‘cristalizar’ uma outra, que não será propriamente nova: a de fazer de conta. O político está acusado de corrupção? Votamos nele na mesma. O pedófilo foi apanhado com as calças na mão? Se calhar, andam a persegui-lo, coitadinho. O dirigente tem uma gestão ruinosa? Ora, chuta-se para canto.

Não pude deixar de lembrar-me desta triste sina – uma virtude que na verdade é um defeito – ao acompanhar pela comunicação social o caso do suposto ‘doping’ da W52-FC Porto. É que os indícios de crime são fortes e foram recolhidos no local utilizado pela equipa de ciclismo, após longos meses de escutas telefónicas. Trata-se de um caso grave, ainda que em juízo venha a provar-se que todos os envolvidos estão inocentes e que as seringas e o resto da parafernália foram ‘plantados’ junto dos ciclistas quem sabe se por um ‘comando’ de camisolas escarlates. E tanto assim é que a UCI resolveu intervir e suspendeu a W52, e o FC Porto anulou a parceria – podendo tê-lo feito mais cedo, é um facto.

O que não vejo, para além do ódio – esse sentimento pobrezinho de que também não logramos libertar-nos – são motivos gritantes para se acusar os portistas. Sim, receberam uma equipa ‘chave na mão’, acreditando que poderia não só levar o nome do clube às estradas do país, como aumentar, com triunfos, o seu prestígio. Mas o que não falta por esse mundo fora são sociedades que se dissolvem porque um dos sócios verificou que, ao contrário do que supunha, o outro não era a melhor das companhias. Quem nunca?

Crítica, sim, merece a Federação de Ciclismo, que podia e devia ter-se antecipado à UCI e se manteve na expectativa, ignorando, lá está, o barulho da chuva. E dando-nos a sensação, certa ou errada, que por ela a W52-FC Porto alinharia à partida da Volta a Portugal.

Do mesmo modo, não se compreende o silêncio do secretário de Estado da Juventude e do Desporto, que não tendo competências para intervir num caso de polícia, tinha o dever moral e a obrigação pedagógica de vir a público repudiar firmemente um caso desta importância. Oxalá me engane, mas a sua postura ‘contemplativa’ passa-nos a ideia de que João Paulo Correia terá optado pelo caminho da inutilidade e da irrelevância que já nos fez até esquecer dos nomes dos seus antecessores.

Os adeptos do MU aplaudiram Cristiano quando entrou para o aquecimento em Old Trafford. E ele escreveu nas redes sociais: “Feliz por estar de volta”. Mais um dia horrível para os falsos moralistas.

Parágrafo final para um antigo futebolista, o ora comentador Cândido Costa, de novo excelente com o ‘Cândido on tour’, programa de autor e divertimento puro, um achado que mostra o futebol como a atividade motivadora e lúdica que grunhos de diversas espécies não se cansam de tentar emporcalhar. No dia do terceiro aniversário do Canal 11, Cândido contou-nos a história extraordinária de um pneu – que ‘não coubera’ na sua ida ao ‘Sagrado balneário’ – e com ela nos levou às lágrimas. Foi bom de mais. Que grande comunicador… chapeau!

Outra vez segunda-feira, Record, 1ago22

Por Alexandre Pais
Alexandre Pais

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