Alexandre Pais

Perdeu-se Rafa, agora é tarde

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Em Portugal, país do oito ou do 80, damos escassa importância aos conciliadores, aos negociadores. E talvez por isso exista tão pouca gente vocacionada para a moderação de conflitos. Vem isto a propósito do desencanto de Rafa Silva que o levou a renunciar à Seleção.

O jogador tem razão em sentir-se frustrado. Não preciso sequer de ir aos livros, pois lembro-me bem da forma como uma e outra vez ficou ‘esquecido’ no banco, como alternativa imprestável. E pelos vistos ninguém o amparou quando se sentiu injustiçado, pois vivemos igualmente na era do cada um por si e que se salve quem puder. Agora, que o vento mudou, Rafa já faz falta, já é o maior.

Aconteceu com o médio do Benfica o mesmo que sucedeu com Grimaldo ou com Vlachodimos, que eram para vender, com Florentino, que parecia fadado para um novo empréstimo, ou com João Mário, que ‘não cabia’ – como dissertavam os supostos entendidos da paróquia – no estilo de jogo de Roger Schmidt: o técnico alemão logrou despertar, em todos, o seu melhor futebol. E sobre Rafa podemos até dizer que terá, hoje, o rendimento mais produtivo de sempre. Tivesse ele marcado à Juventus, na Luz, um terceiro golo, com aquele remate que esbarrou no poste, e seria ainda mais ridícula a sua exclusão da ‘equipa da semana’ da Champions.

Será difícil que alguém acredite que antes de Rafa comunicar à FPF a sua vontade de não mais ser convocado, nem Fernando Gomes nem Fernando Santos – a quem não faltarão informadores solícitos e veneradores – sonhassem com essa possibilidade. Houve, certamente, tempo para ouvir Rafa, para o esclarecer, para lhe dar uma perspetiva de futuro na Seleção. O certo é que ninguém se dispôs a fazê-lo e agora é tarde. Primeiro porque a decisão está tomada, depois porque Rafa ficou de fora da lista dos 55, e finalmente porque o selecionador – a existir uma mudança de posição – não poderia ficar refém do jogador, sentindo-se ‘obrigado’ a utilizá-lo só porque lhe foi pedido que repensasse e ele repensou.

É verdade que sem Rafa, sem Pedro Neto e possivelmente sem Diogo Jota – e com Guedes suplente do penúltimo classificado da Premier e numa forma horrível – a crise de ‘criativos’ na Seleção é um facto. Mas quem foi para o mar e não se aviou em terra sujeita-se ao naufrágio, é a vida.

Parágrafo final para António Silva e para a dúvida que muitos erguem: é a sua hora ou pode ser cedo para a chamada à Seleção? Se outro dos convocados por Fernando Santos for David Carmo – que voltou a falhar, agora no lance que deu o empate ao Santa Clara – acho falta de experiência em excesso. Se tivesse eu de escolher, convocaria Pepe, Danilo, Rúben Dias e José Fonte, este ainda em excelente condição no Lille. Mas a pressão para que fique ‘esquecido’ será muita. Por outro lado, Pepe ou Danilo ou os dois poderão não recuperar – ou recuperar apenas para integrar a lista dos 26 – e Domingos Duarte e Gonçalo Inácio teriam então uma hipótese, como Tiago Djaló. Enfim, temos nove (!) para optar por quatro, mas poucas certezas quanto à solidez do bloco central da defesa para o Mundial. E se fosse só a defesa…

Outra vez segunda-feira, Record, 31out22

Por Alexandre Pais
Alexandre Pais

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