Não me incomodou muito a canalhice da divulgação da conversa em “off” do primeiro-ministro. É o país de delatores que temos. Como não me chocou a pulhice com Vítor Gaspar, em 2012, quando o então ministro das Finanças quis mostrar serviço ao congénere alemão, foi apanhado pelos microfones e viu o seu confrangedor diálogo rapidamente difundido – com o aplauso de algumas virgens ofendidas que suspenderam agora as férias para amortecer o “cobardes” de António Costa.
Também me ralo pouco com a suposta indignação dos médicos, cuja Ordem devia averiguar, sem pruridos corporativos, se houve mesmo clínicos que recusaram assistência a internados do lar de Reguengos com a alegação errada da falta de condições – errada, sim, porque quanto piores as condições mais o apoio médico se justificaria.
O que de facto me dói é o branqueamento provocado pelo ruído excessivo de uma polémica que a nada conduz. É que enquanto barões da política e da medicina trocam acusações espúrias, em dezenas (?) de lares há idosos tratados com desumanidade, que só “existem” se tiverem covid. Os outros continuam a viver em situações degradantes – criminosas, até. E ninguém quer saber.
Os hipócritas são ainda piores que os bufos.
Antena paranoica, Correio da Manhã, 29ago20
Ninguém quer saber dos idosos maltratados
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