Alexandre Pais

Naby Sarr: amigo de Platini, passageiro do vento

N

Testemunha de defesa. Juro que vi. Vi Sarr impecavelmente colocado para abafar o livre que o tipo do Schalke despejou sobre a área leonina. E quando, de frente para a bola, a ia repelir, eis que ao marselhês se antecipa um argelino, Slimani – que também fala francês mas que não tocará piano – a cabecear para trás e a violar as redes de Patrício. Lembrei-me do “pescoço duro” de Maurício, no golo que apontou pelo Vitória. Cabecear não é só bater com cabeça na bola, mas dar-lhe a direção adequada. Após o autogolo de Guimarães, o desastre coletivo e a infelicidade das acusações de Bruno de Carvalho, uma nuvem ainda mais negra carregava sobre Alvalade.
Naby não é nabo. Confesso a minha simpatia por Sarr. Primeiro por ser “black” numa sociedade branca, felizmente antirracista, embora não tanto como se gostaria. E por se chamar Naby – “nabo”, como dirá essa espécie incontornável que é o sportinguista fatalista. Depois porque é emigrante, cá arribou sem saber uma palavra de português, a adaptação dói. Como se não bastasse, tem apenas 21 anos, veio de uma equipa secundária e começou-se logo por exigir-lhe tudo. Finalmente, o seu 1m96, o porte físico imponente e a necessidade que o Sporting tem de que “funcione” depressa, podem fazer com que Sarr se torne num bom central.
Talento e trabalho. Dizia Goethe, que a genialidade é esforço, embora os génios pareçam muitas vezes desmenti-lo, ao dar a ideia, errada, de que tudo conseguem sem dedicação total. Se Cristiano Ronaldo, por exemplo, é o primeiro a chegar aos treinos e o último a ir-se embora, isso revela porque é melhor do que os outros: juntou ao génio que nasceu com ele o trabalho a que não se deram tantos “brinca-na-areia” que ficaram pelo caminho.
Vitória do esforço. Claro que Sarr percebeu de imediato que jamais alguém culparia Slimani pelo autogolo – era a sua zona de cobertura, o burro era ele. E lá foi ao coração da área adversária, antecipar-se a… Slimani – a vingança serve-se fria! – para marcar o golo do empate e que viraria o lado do vento. Daí em diante, a exibição do francês foi um exemplo de esforço, de determinação, de entreajuda, de vontade de vencer, de dizer “eu estou aqui”. Felizmente para Naby, no segundo golo dos alemães foi Paulo Oliveira quem andou aos papéis. É: não pode tocar sempre aos mesmos.
Palavra de Platini. Aos 64 minutos – dois antes de Patrício fazer a (magistral) defesa da noite – Sarr podia ter borrado a pintura ao “embrulhar-se” com Meyer, já dentro da área. Mas nesse lance, como em mais três ou quatro ao longo da partida, o central dos leões contou com a solidariedade francesa, pois Platini dera-lhe uma garantia depois da grande penalidade fantasma que assombrou Gelsenkirchen: “Joga tranquilo, mon petit, que eu já disse ao Tagliavento que, pelo sim, pelo não, em Alvalade não marca penáltis!” E assim foi, que isto de falar francês também traz vantagens. Allez, Naby!
Contracrónica, Record, 6NOV14

Por Alexandre Pais
Alexandre Pais

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