Nos muitos anos que já levo de profissão, nunca vi opinião publicada mais poderosa do que a espanhola e, ao mesmo tempo, comunicação social mais viscosa do que a do país-vizinho.
Basta recuar a 2003 e à contratação de Carlos Queiroz pelo Real Madrid. Mal aterrou em Barajas, a imprensa especializada desfez-se em elogios, os merecidos e os supostos, elogios que subiram de tom com a conquista da Supertaça ao Maiorca, então treinado por Jaime Pacheco. E nem um primeiro aviso de que o caminho do ex-adjunto de Ferguson não seria fácil – a derrota no jogo da 1.ª mão, em Palma de Maiorca, por 2-1 – foi tido em conta, já que uma equipa que tinha Zidane, Raúl, Ronaldo, Roberto Carlos, Figo, Beckham e Casillas parecia imbatível. A hipocrisia, disfarçada pelos 8 (!) pontos de avanço à 25.ª jornada da liga, quebrou a máscara com a chegada dos maus resultados, e enquanto se instalava o veneno da tradicional intriga intestina madridista os jornalistas espanhóis iam desfazendo Queiroz em mil pedaços. E o Real terminaria no quarto lugar, a 7 (!) pontos do campeão, o Valencia.
Aconteceu depois tramoia semelhante com José Mourinho, que dos solos de harpa desceu ao inferno, e sucede hoje o mesmo com Cristiano Ronaldo, sempre incensado para captar leitores e audiências, mas cuja crucificação segue o seu curso, primeiro com a “sequía” de golos a martelar 24 horas por dia, e após as cinco batatas ao Espanhol com uma nova e criativa abordagem: a do “goleador intermitente”. Com a ajuda de Benítez – o Real é um conjunto de sombras – a campanha está na estrada, segura como a da morte que se sabe ser certa.
Canto direto, Record, 28SET15