Alexandre Pais

A tese do fogo posto esconde o que não foi feito

A

O truque repete-se e a tragédia também: temos já metade da área ardida da UE. Impotentes perante a calamidade, os responsáveis pela organização do combate recorrem à gasta tese do fogo posto. Foi o que fez há dias, na RTP, Jorge Gomes, secretário da Administração Interna, ao lançar a suspeita de crime sobre os sinistros que se iniciam de noite.
Tenta-se, desse modo, tirar o foco do que não se fez: a limpeza das matas e dos espaços à volta das casas, e o reforço da vigilância, com recurso a equipamento atualizado de deteção, como pediu, pela enésima vez, Jaime Marta Soares, presidente da Liga de Bombeiros, antes de aderir à ideia do fogo posto, apresentando uma nova tese conspirativa, a do “terrorismo”.
Assim se adia o debate sobre as medidas – que vão de uma solução para os terrenos abandonados até à regulação adequada das espécies florestais ou à reflorestação das áreas ardidas, que é quase inexistente – a tomar de acordo com a ciência e com os especialistas, e não através de opiniões avulsas, de autênticos “achódromos”, de políticos obcecados com a restrição dos meios.
O fogo é um inimigo feroz que só pode ser combatido com uma estratégia nacional que sobreponha a intervenção às falinhas mansas e imponha o dever cívico e a lei à nossa atávica indiferença pela segurança: só agimos, se formos obrigados. E não queremos mudar – preferimos ver arder e chorar depois.
Antena paranoica, Correio da Manhã, 13AGO16

Por Alexandre Pais
Alexandre Pais

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