Nunca fui um profissional da noite.
Ao longo de uma década, entre 1986 e 1996, dirigi publicações que dependiam
muito de quem era quem nas festas
e nas discotecas, o que me forçou não a ser propriamente noctívago, mas a andar
por aí. Não me recordo de existir, ao tempo, mais que uma patroa da noite, já que só o Trumps era liderado por uma mulher, Rosa
Maria. O resto eram patrões ou
pequenos reis, como Pedro Luz,
talvez o único que foi até imperador, os manos Rocha, Tomás Taveira,
Raul Martins, Vítor Matias, José Manuel Trigo, Liberto Mealha, José Nuno Martins
– o Loucuras, ah, pois é! – Raul
Rodriguez, José Manuel Simões e mais uns tantos que o meu disco da memória,
justa ou injustamente, não teve capacidade para guardar.
Uns anos antes, logo a seguir à
revolução, frequentei durante alguns meses o bar da moda, o Frágil, recém-aberto no Bairro Alto e
rival do célebre Procópio, das
Amoreiras, onde militares sem tropas conspiravam, entre os vapores do éter,
contra o Grupo dos Nove ou contra o gonçalvismo. O Frágil pertencia a uma amiga, Paula
Taborda, e ao futuro marido, e tinha uma particularidade curiosa: a porta ou não
se abria ou só franqueava a entrada se a dona, Margarida Martins, quisesse sair da
frente. Nessa altura, ela pesava bem mais de 100 quilos, o que a tornava
inamovível. Impiedosa na selecção da clientela, Margarida era uma verdadeira
patroa da noite lisboeta.
Não distingo hoje, na execução do
que quer que seja, diferenças entre homens e mulheres. Não interessa o género de
quem é bom a gerir, dirigir ou coordenar, como ele nada conta quando topamos com
a incompetência tão presente no quotidiano. E lamento mesmo que as jornalistas
com quem tenho o prazer de colaborar no Record, mais de uma dezena – autênticas
patroas da noite que tantas vezes
sacrificam família e tempos de lazer para trabalhar fora de horas – não sintam,
genericamente, vocação ou vontade para assumir mais responsabilidades e mostrar
a alguns colegas que são melhores.
Afinal, todo a nosso percurso é
condicionado pela influência das patroas da noite, e do dia, de cada um.
Para o bem ou para o mal. Como aconteceu agora com Laura, mulher de Passos
Coelho, que não foi capaz de evitar – se é que não partiu dela até a ideia desse
chocante momento de relax – que o
marido anunciasse o maior ataque ao bolso dos portugueses e seguisse de São
Bento para o concerto de Paulo de Carvalho. Onde se deixou filmar a cantarolar
descontraidamente canções de esquerda como se não tivesse acabado de
lançar uma bomba sobre o país. PPC perdeu mais votos com a falta de
sensibilidade política da sua patroa do que com a desgraçada proclamação
anterior.
Observador, crónica publicada na edição impressa da Sábado de 14 setembro 2012. Tema de Sociedade da semana: patroas da noite…