Alexandre Pais

Época aberta para o tiro ao engenheiro

É

Professores, doutores e arquitetos do pontapé na bola vivem o momento de glória há tanto tempo esperado e pedem a ‘cabeça’ do selecionador nacional. Tudo porque Fernando Santos defendeu uma bola e deixou-a fugir para dentro da baliza, consentindo o empate na Luz. A seguir, aos 52 minutos, porque foi egoísta e quis fazer o seu segundo golo, em vez de servir Cristiano Ronaldo, sozinho no coração da área. E também porque, ao cair do pano, o mesmo Fernando Santos permitiu que três (!) sérvios ‘acampassem’ nas suas costas, para que um deles, que atua na segunda divisão inglesa, marcasse o golo da vitória e atirasse a Seleção de novo para um ‘play off’. É o fado português – o ‘play off’’ e o tiro ao engenheiro.

Já depois do empate em Dublin as redes sociais tinham fervido – não como ontem, claro. Dois terços dos opinantes destilavam fel sobre Fernando Santos, que culpavam por mais uma exibição frouxa da Seleção. Resistia o outro terço, mais cerebral e pouco recetivo a insultos boçais, com o argumento – que subscrevo – que foi Santos a conduzir-nos aos únicos dois títulos da história da nossa equipa principal de futebol.

Outra tese, menos destacada mas igualmente pertinente, deixava de parte as comendas pelo que se conseguiu no passado e mexia com a realidade – e com o desempenho dos jogadores. Quase sem tempo para treinar e apenas com a possibilidade de recuperar atletas sobrecarregados de jogos e tentados pelos serviços mínimos que não lhes condicionem a época nos clubes, Fernando Santos é um gestor de condições físicas e mentais, de egos e de oportunidades. É aí que ele começa por ganhar ou perder os jogos e não por ter optado pelo ‘A’  em detrimento do ‘B’. Podemos, é verdade, questionar as opções táticas e esta ou aquela substituição, mas isso é da competência do selecionador. Podia ser a de qualquer um de nós mas é a dele, que tem provas dadas, enquanto as nossas e as dos professores, doutores e arquitetos… pobres delas, coitadinhas.

O que vi no confronto com a Sérvia foi um alinhamento de futebolistas ricos, acomodados, saturados, convencidos da sua inegável superioridade individual e incapazes de se divertem em campo – situação agravada por 60 mil gargantas eufóricas na plateia e um golo fortuito aos 2 minutos que fez com que acreditassem que iam ser favas contadas. Não foram. Aliás, nunca são quando pela frente se encontra uma equipa coesa, composta por homens empenhados em afirmar-se e determinados em fazer o jogo das suas vidas. Tão simples como isso.

Parágrafo final para o caso do ataque a Kheira Hamraoui, futebolista do PSG, agredida – nas pernas, com uma barra de ferro – por um ou dois bandidos supostamente ligados à sua rival no ‘onze’ titular, Aminata Diallo. Esta foi detida como provável mandante do crime e mais tarde libertada, por a polícia ter compreendido que a ‘guerra’ por um lugar na equipa – atuam ambas na mesma posição – não estava na origem do caso, como supôs, tudo apontando agora para o facto de a vítima ter posto termo a uma relação amorosa… ‘complicada’. Falta-me só acrescentar que Kheira é loura e Aminata negra, o que, obviamente, não tem pouco a ver com a confusão. O preconceito, sempre ele.

Outra vez segunda-feira, Record, 15nov21

Por Alexandre Pais
Alexandre Pais

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