Passei no Algarve aqueles dias de férias em que normalmente ignoro as desgraças do dia a dia na paróquia, objetivo não cumprido este ano por absoluta incapacidade de pôr de parte o ‘caso’ Luís Filipe Vieira.
Mesmo assim, pude dedicar-me à leitura e logo mergulhei no ‘bestseller’ de Thomas Erikson, ‘Rodeado de psicopatas’, editado pela Lua de Papel, que o especialista em comunicação sueco lançou após o êxito de ‘Rodeado de idiotas’ – outro autêntico tratado de análise de comportamentos.
É uma obra enriquecedora, estupidamente fora das prioridades de homens de negócios, governantes ou presidentes de clubes, e na qual pude ‘reencontrar’ alguns tipos inesquecíveis com que me defrontei ao longo do meu percurso profissional, e que tantas vezes ultrapassei sendo mais ‘psicopata’ do que eles – como recomenda o grande livro da sobrevivência.
Erikson recorre a diferenciações baseadas nas conclusões do psicólogo norte-americano William Marston (1893-1947) – que criou a linguagem DISC – aplicando cores a cada um dos quatro comportamentos principais: vermelho para a dominância, amarelo para a influência, verde para a estabilidade e azul para a capacidade analítica. De uma forma geral, as pessoas ‘encaixam’ numa das cores ou são um pouco de cada uma, já que o autoconhecimento permite ir corrigindo aquilo em que se é menos forte.
O pior reside no que o escritor nórdico designa por ‘nenhuma cor’, cerca de 4% da população. É aí que se encontram os ‘predadores na forma humana’ – indivíduos de duas faces, manipuladores, mentirosos, desafeiçoados ao trabalho e, apesar disso, por vezes extremamente populares – que se infiltram nas empresas e nas organizações. “Muita gente gosta deles e até os respeita”, reconhece Erikson.
Passando da teoria à realidade, direi que me repugna a mudança de atitude de todos aqueles – e eram tantos, tantos… – que há um mês abanavam o rabo a tudo o que vinha de Vieira e hoje o tratam como o último dos bandidos, condenando-o ao degredo para a eternidade. Nada, no entanto, que a inacreditável ingenuidade dos 72 anos do ex-líder do Benfica não devesse esperar, calculando-se que em décadas de refrega na selva da vida jamais terá reservado um tempinho para conhecer a natureza dos homens, perceber os sinais, identificar as serpentes e abater os predadores. Sim, custa a acreditar!
E como referi um livro, recomendo outros dois que li este mês: ‘O regresso das ditaduras?’, de António Costa Pinto, uma edição da Fundação Francisco Manuel dos Santos, e ‘Mantenham-se loucos e famintos’, da Prime Books, um notável trabalho de João Gabriel, uma das pessoas de maior qualidade que conheci na minha abstraída e já distante passagem pelo mundo cão do futebol. Chapeau!
Parágrafo final para o capitão da seleção belga, Jan Vertonghen, que no livro de honra do hotel em que estive – e em que ele e Seferovic também descansaram com as famílias – escreveu: “O melhor staff, a melhor comida, o melhor tempo, o melhor lugar! Gostámos muito e voltaremos. Obrigado pelas grandes memórias”. Que falta faz gente desta em Portugal…
Outra vez segunda-feira, Record, 26jul21