A junta da União de Freguesias de Ovar, São João, Arada e São Vicente de Pereira Jusã, no concelho de Ovar, que se encontra desde o dia 18 em estado de calamidade, cancelou, no sábado, os eventos públicos. Não o fez até 9 de abril, 1 de maio ou 10 de junho… fê-lo até final do ano. Quer isto dizer que Bruno Silva, o presidente da junta, é mais inteligente ou tem mais juízo na cabeça do que boa parte dos dirigentes desportivos, que à nora com o desconhecido vão alimentando teorias de reposição das competições, ainda com a conclusão a todo o custo da presente época atravessada na garganta. Apontam datas, definem hipóteses de curto e impossível prazo, e sonham com soluções ideais como se a covid-19 fosse uma mera incomodidade. Deviam olhar, por exemplo, para o pragmatismo de Fernando Gomes, presidente da Federação Portuguesa de Futebol, que deu um primeiro passo importante, cancelando todas as provas de futebol e futsal, nos escalões de formação. Não haverá campeões, nem subidas ou descidas. O comunicado da FPF coloca, aliás, o foco onde ele pertence: “a prioridade de pais, avós, filhos e netos deve ser a de se dedicarem à proteção uns dos outros”.
Os devotos da utopia começam a ser cada vez menos, é verdade. Enquanto uns, como Bartomeu, no Barcelona, ou Cerezo, no Atlético de Madrid, se vão entretendo a reduzir os incomportáveis salários dos jogadores, como se só daí viesse a salvação, outros veem mais longe. É o caso de Andrea Agnelli, presidente da Juventus, que tendo assegurado igualmente uma poupança – de 90 milhões de euros – na folha salarial, proferiu a frase que tudo define: “Os clubes enfrentam uma ameaça à sua existência”. É disso que se trata.
Parece hoje consensual o cálculo dos especialistas de que só em maio a Europa atingirá o “pico” ou o “planalto” da pandemia, o que significa que os casos positivos serão milhões e os mortos centenas de milhares. Acham que é exagero? Peguem amanhã nos dados do final de março, ponham-lhes em cima 10 ou 15% de aumento em cada um dos 30 dias de abril e terão, na brutalidade do acumulado, uma visão real do inferno. Mais: haverá talvez três meses – até agosto – de curva descendente e com um total de vítimas também relevante. Por isso, não iremos de férias e as aulas dificilmente recomeçarão em setembro. E em outubro, alerta quem sabe, o coronavírus voltará. Querem recomeçar o futebol? Ótimo, é o que queremos todos. Mas trabalhem com os pés na terra e salvem os clubes, antecipem a realidade económica e a hecatombe social pós-vírus, e tomem nestes dias de chumbo as medidas difíceis para cá estarem depois.
O último parágrafo é de novo dedicado ao esgoto das redes sociais, onde se insultam os milionários do desporto por ganharem fortunas e darem apenas “uns trocos” para o combate à peste – e só Cristiano e Jorge Mendes já vão em 4 milhões de euros. É o habitual mundo ao contrário dessa cáfila: insurge-se contra quem é generoso e poupa os sovinas cuja solidariedade é zero.
Outra vez segunda-feira, Record, 30mar20
Precisamos de presidentes da junta!
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