Não existirá entre nós gente mais elitista que os escritores. E não creio que haja pessoas que eles mais detestem do que as figuras da televisão que escrevem livros.
Imagino assim a raiva com que ouvem, na TV, a promoção de uma obra assinada por um pivô em que o autor é apontado – por opção da editora ou do próprio – como “um grande escritor”. Não sendo nem verdade, nem eu fã do jornalista, agrada-me a indignação que o delírio provoca porque se algo ainda me irrita é o espírito de casta de algumas criaturas.
Refiro isto a propósito do espetáculo com que um grupo de intérpretes quis esta semana ajudar as vítimas dos terríveis incêndios do centro do país. Apesar do clima desfavorável ao politicamente incorreto e da beleza do abraço solidário esmagar qualquer crítica, não resisto a dar voz aos excluídos – cantores tão queridos do público como os que estiveram no Meo Arena. E que são artistas igualmente tocados pela tragédia, disponíveis para o auxílio e merecedores da oportunidade de servir que uma casta lhes negou.
Portugal uniu-se contra a visita do diabo a Pedrógão Grande, mas desperdiçou o momento para derrotar também a pretensão de superioridade intelectual. Nem o inferno nos muda o ADN.
Antena paranoica, Correio da Manhã, 1 JUL17
A pretensão tomou conta do Meo Arena
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