Alexandre Pais

Uma cabeça de holandês em bandeja de prata

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A verdade desportiva é muito bonita, mas confesso que preferia que o dérbi terminasse em 3-6, sem golos invalidados e num hino ao futebol de ataque e à beleza do jogo. Esse suposto resultado teria, aliás, evidenciado de forma ainda mais clara a fragilidade da defesa leonina e a pobreza relativa do plantel do Sporting – a propósito, por onde andam os talentos da Academia? Até esse bebé deitaram fora com a água do banho…
É que ter como titulares – e digo-o com todo o respeito – futebolistas da craveira de André Pinto, Bruno Gaspar, Jefferson ou Gudelj e pretender com esse “gap” derrotar os rivais é viver do sonho, não da realidade. Que treinador conseguiria, com tal matéria prima, apresentar resultados de excelência?
É certo que tirar Nani para meter Diaby e fazer duas substituições aos 87 e aos 90 (!) minutos, numa partida em que perdia desde os 11, também nos esclarece que a nabice não é exclusiva de meia dúzia de jogadores. Quero com isso dizer que Marcel Keizer começa a revelar as suas limitações: é uma pessoa respeitável e um técnico com potencial, mas veio diretamente do seu planeta para um país de doidos, que não conhece e onde pisa terreno armadilhado. A continuar assim, não tarda que o dr. Varandas, para alijar a carga de insultos que lhe cai em cima – ontem, nas redes sociais, foi um fartote – sirva aos irados adeptos, que esperavam um milagreiro, uma cabeça de holandês em bandeja de prata.
Curiosamente, com todos os olhos virados para o Benfica e para a amizade de Luís Filipe Vieira com Jorge Jesus, ninguém fala da possibilidade do regresso do treinador a Alvalade. Sim, eu sei que existe um problema grave de tesouraria, que Jesus dificilmente deixará de querer ganhar este mundo e o outro, e que há a questão do fisco, mas o que é que já não vimos no futebol português? Até porque com o Benfica a jogar assim, Bruno Laje está sentado num trono de ferro.
Como dei a entender atrás, não perdoo ao VAR ter-me roubado três golos, mesmo que a superioridade encarnada haja afastado outras polémicas e as anedotas do costume tenham, desta feita, escapado incólumes. Dou apenas um exemplo: a eventual falta de João Félix, envolvido num corpo a corpo banal com Wendel, e que levou à anulação de um grande golo. Os intervenientes hesitaram, à espera de saber se Soares Dias assinalava ou não alguma irregularidade, e o árbitro, perto e bem de frente para o lance, mandou seguir. Depois, com gritos nos auscultadores e submetido ao clamor dos protestos leoninos, foi rever no monitor o que já tinha visto a metro e meio de distância e marcou falta de Félix. Se o melhor árbitro português funciona desta maneira, o que esperar da arraia miúda?
A propósito de João Félix, que se exibiu a grande altura e falhou ainda um golo cantado, atenção, no banco benfiquista, a um tal de João Filipe, também de 19 anos e conhecido por Jota, 55 vezes internacional pelas seleções jovens e que tem nos pés o talento de Félix. Falta saber como funciona, na alta competição, a sua cabeça: se for boa, será outro caso sério.
O derradeiro parágrafo vai para a nova depressão do leão. “Se hoje foi assim, quantos levamos na quarta-feira?” – perguntava-se, no Twitter, com a expectativa muito em baixo. Calma. Não há jogos iguais, Keizer terá aprendido a lição e muito dificilmente a história se repetirá. Tomem nota que há sempre uma vez em que não me engano.
Outra vez segunda-feira, Record, 4fev19

Por Alexandre Pais
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