Chegaram com atraso mas chegaram, de braço dado com o calor intenso – numa união que fragiliza a tese do fogo posto – e para alívio dos alinhamentos noticiosos, que assim se libertaram das reportagens de coisa nenhuma: de férias ou pontes, de sol baço ou falta de chuva, de combustível que sobe mais do que desce. Sim, temos os incêndios connosco e já uma certeza: do que ainda restava verde pouco sobrará este ano.
O inefável ministro Cabrita, cuja aparição nos assombra quase tanto como as chamas, vende uma eficácia que se sabe mais dependente dos desígnios de São Pedro – e da tenacidade heroica dos que combatem, sem visibilidade, nem reconhecimento – do que da arte da tutela para proteger florestas e culturas, vidas e bens.
Verdade se diga que se corrigiram leis e procedimentos, mas a resistência das comunidades está ao nível da inépcia do Estado: os baldios continuam matagais e a tralha que rodeia casas e armazéns, currais e capoeiras, mantém-se firme, fiel ao seu destino de alimentar o fogo.
Podemos culpar quem quisermos. Enquanto não mudarem os comportamentos – os individuais e os do Estado calão – iremos ardendo, ano após ano, delegando nos sobreviventes a piedosa tarefa da lamúria eterna.
Antena paranoica, Correio da Manhã, 27jul19
Vamos continuar a arder
V