Sei que há para aí umas escutas – direta, indiretamente ou em nada –relacionadas com o ‘caso Vieira’, mas não me apetece dar para esse peditório deprimente. Quem prevaricou que se amanhe. Estou mais preocupado com o beco em que se meteu Cristiano Ronaldo, ao decidir, menos com a cabeça do que com o coração, regressar ao clube que o projetou, sem ter em conta que desde a partida de Mourinho nunca mais o Manchester United ganhou um título e que a equipa estava, e continua a estar, entregue a um técnico de segunda linha, incapaz de aproveitar o potencial de um plantel de estrelas.
Ao comentar a ausência de Cristiano do trio de finalistas do prémio The Best, o seu antigo companheiro no Real Madrid e na Juventus, Sami Khedira, pôs o dedo na ferida: “Não nos podemos esquecer que ele tem 36 anos”. Sim, por muito que nos custe, a inexorável marcha do tempo fez de Cristiano um jogador diferente, ainda capaz de integrar o lote restrito dos melhores futebolistas do Mundo, mas já não o número 1, já não o avançado único que carregava a equipa às costas e resolvia as partidas. Hoje, ele raramente parte ‘para cima’ do adversário e falha demasiado na cara do golo – não é letal como foi no Real, na Juve e na Seleção. Joga mais para a equipa e participa mais no processo defensivo, mas perdeu velocidade e no remate tem menos espontaneidade e menos potência. Ao seu melhor nível, só em modo ‘air Cristiano’.
Aliás, mal deixou Turim, antigos companheiros de beijos e abraços logo o responsabilizaram pelo baixo rendimento anterior da Juve, ‘esquecendo’ a centena de golos que marcou e o que isso contribuiu para que tudo não fosse pior. Basta ver a modesta primeira volta da Juventus na Serie A – já sem o ‘peso’ de CR7, está a 11 pontos do Inter, que tem menos um jogo, e a 10 do Milan. Afinal, de quem era a culpa?
Mas o problema de Cristiano agravou-se em Manchester, onde começou por ser recebido em êxtase, para depois ver o entusiasmo esfumar-se ao ritmo a que se acumulavam os resultados negativos. O sistema tático não o beneficia, o jogo do United não flui e a bola pouco lhe chega. E nos média não param de surgir os velhos ídolos despeitados, de dedo espetado. Gabriel Agbonlahor, antigo avançado do Aston Villa e da seleção, diz que “Solskjaer sabe que cometeu um erro ao trazer Cristiano Ronaldo”. E Paul Ince, comentador e ex-jogador do MU, entende que Cristiano não devia ter sido capitão contra o Wolverhampton, enquanto Paul Merson, igualmente comentador e ex-futebolista, defende a sua saída do onze titular: “Considero firmemente que o Ronaldo devia ser deixado de fora”. Sentindo a pressão, o ‘Daily Star’ aponta o verão para a saída do craque português do United, o que seria um falhanço desportivo completo.
Com inimigos também ao lado – Maguire, Shaw… – Cristiano está novamente entregue a si próprio. Ou volta às grandes exibições e continua a somar muitos e decisivos golos, calando uma vez ainda os críticos, ou verá aumentar para níveis insuportáveis o coro dos chacais que vivem do sangue das vítimas. Mas há um ‘pormenor’ que nos deixa particularmente céticos: é que em menos de um mês o nosso homem completará 37 anos – e os ‘milagres’, mesmo para os génios, tornam-se cada vez mais difíceis…
Outra vez segunda-feira, Record, 10jan22