Em Dezembro de 1997, o criador do projecto do 24 Horas, José Rocha Vieira, nomeou-me chefe de redacção do novo diário. Nas instalações do Marquês de Pombal, no edifício adquirido pelos suíços da Edipresse, havia só duas secretárias na imensa alcatifa azul: a minha e a do José Carlos Rodrigues. Mas depressa o espaço se encheu. Vindos do Diário de Notícias ou da Nova Gente, da Capital ou do Público, do Record ou da TSF, dezenas de jornalistas foram contratados, muitos com salários elevados, sem que se lhes conseguisse definir a linha editorial. O melhor que se arranjou foi dizer que adoptaria uma abordagem diferente, que contaria histórias, que seria popular com qualidade – um ovo de Colombo. Fui a primeira vítima do equívoco: no lançamento, em Maio de 1998, já era editor da revista de domingo.
Creio que o 24 nunca se restabeleceu dessa indefinição. O compromisso com a qualidade fez dele, durante dois anos, um tablóide envergonhado, que só não fechou porque houve a arte de lhe encontrar comprador. E quando o jornal assumiu, enfim, a vocação verdadeiramente popular que lhe poderia ter garantido a sobrevivência – se outros erros não viessem a ser cometidos – alguns jornalistas, sacrificados pelo realinhamento editorial, tiveram de ser afastados, não por falta de capacidade mas por inadequação do seu perfil à nova realidade. Voltei à chefia, em 2000, e participei, já como director, em 2002, nessa acção dura, penosa e inevitável. Não foi a primeira, nem seria desgraçadamente a última.
Na redução de quadros
Só pode seguir-se o critério
de ficar com os melhores
Dimensionado para corresponder às exigências de um jornal que chegou a vender mais de 100 mil exemplares diários, a quebra de circulação, iniciada em 2001, forçou o Record a reduzir, entre 2007 e 2012, o quadro de colaboradores. Como director, segui o critério de sempre: ficar com os melhores mesmo que não gostassem de mim. E disso jamais me arrependerei.
Parece que foi ontem, Sábado, 19JUN14
Quem engana sempre escapa
Os 160 despedimentos da Controlinveste recordam-me as duas vezes em que fui dispensado: em 1972, do Diário de Lisboa – ao qual voltaria passados alguns dias – por não ter cumprido uma ordem do chefe, e em 1978, da RDP, por questões políticas. Sei, assim, o que isso custa, em especial, como era o meu caso, quando há filhos para criar.
Estive igualmente do outro lado, como director de publicações que acabaram ou que tiveram de reduzir drasticamente os custos. E sei, do mesmo modo, que não se dispensam pessoas sem um sentimento de amargura – se não conseguimos defender esses postos de trabalho é também porque falhámos.
Mas aprendi outra coisa: quem paga as crises são quase sempre os inocentes. Contratados depois de gurus megalómanos seduzirem accionistas ou administrações com promessas de lucros e objectivos impossíveis de alcançar, tornam-se descartáveis no momento em que o logro fica à vista.
Quando se dispensam trabalhadores não é aos mensageiros, que cumprem ordens, que devem assacar-se as culpas. Aponte-se antes o dedo aos vendedores de ilusões, que utilizam o seu poder enganador se o vento corre de feição – empregando os amigos com salários exagerados – e assobiam para o ar mal chega a hora de fazer contas – afastando então aqueles que, alguma vez, ainda que pela mais justa das razões, lhes disseram não. E, claro, eles ficam.
Observador, Sábado, 19JUN14 (Na foto, à janela do meu gabinete no edifício do DN, no último dia em que trabalhei no “24 Horas”: 10 de fevereiro de 2003)
- Jose Paulo Fernandes-Fafe Meu caro, se alguém foi responsável pelo êxito do “24 Horas” foste exclusivamente tu – por muito que isso custe a alguns. E a prova disso mesmo é que a tiragem, venda e influência (chamemos-lhe assim) do jornal durante o teu “consulado” falam por si. Para fazer jornais com êxito não basta vangloriarmo-nos que os fazemos, é – isso sim e tão só – sabê-los fazer. E isso aí meu caro, tu sabes – e não é de hoje. E bem, diga-se de passagem! Abraço forte e amigo do teu admirador, ZP (in Facebook)