Num mercado em que os artistas têm de se dedicar a outras atividades para pagarem as contas da água e da luz, é bom ver que qualidade de entretenimento não falta entre nós – o que faltam são oportunidades. Foi dentro desse espírito que encarei a ideia de Manuel Luís Goucha imitar Rosinha e de Cristina Ferreira se tentar meter na pele de Nel Monteiro, na última edição de “A tua cara não me é estranha”, na TVI. Mas houve quem não aprovasse, tanto os “bonecos” como a suposta falta de estatuto dos imitados, nesse lago de fel em que muita gente frustrada se banha furiosamente nas redes sociais.
E eu, que já não me irrito com quase nada, irritei-me com isso. Nel Monteiro foi, na década de 80, o grande pioneiro da música popular ou pimba, chamem-lhe como quiserem. Ele carregava malas com cassetes que vendia – e vendeu milhões – aos nossos emigrantes, e regressava a Portugal para preparar novas viagens e fazer novos carregamentos. Foi um herói, um herói discreto e despretensioso, na sua capacidade de sofrimento e na vontade indomável de ser artista e de como tal sobreviver.
Sinto-me, por isso, identificado com o que Manuel Luís Goucha confessou esta semana no “Você na TV”: também gosto de música clássica e gosto de Nel Monteiro. Chapeau!
Antena paranoica, Correio da Manhã, 21JAN17
Nel Monteiro, o herói discreto
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