Os tempos são o que são e, por muito que um profissional ganhe, aquilo que tem sabe sempre a pouco. Mas confesso que me entristece ver um jogador que podia ficar como símbolo de um clube trocá-lo por um prato de lentilhas… ou talvez mais.
Ainda há semanas, João Mário dizia que o título obtido pelo Sporting tinha sido o concretizar de um sonho de criança, o que parecia sincero e normal, uma vez que entre os 11 e os 23 anos ele construiu a sua carreira – e alcançou o zénite – no clube de Alvalade, com cuja camisola, aliás, conseguiu os quatro títulos do futebol português.
O nível que JM atingiu, graças ao seu trabalho, sem dúvida, mas também ao enquadramento proporcionado pelos leões, levou a que o Inter, após a conquista do Europeu ao serviço da Seleção, tenha investido a barbaridade de 40 milhões de euros num bom médio que não era, na minha modesta opinião, um jogador fantástico. E o resultado desse negócio de risco depressa se viu: baixa de rendimento em Milão e cedência a equipas do meio da tabela europeia, como as do West Ham e do Lokomotiv de Moscovo, nas quais igualmente não triunfou.
Valeu a João Mário um terceiro empréstimo, desta feita ao emblema certo, o Sporting, e a competência de Rúben Amorim que o transformou numa espécie de irmão mais velho dos seus meninos. Melhorou então o desempenho, como se JM fosse um daqueles jogadores que são bons num clube mas que não se adaptam a outros ambientes e a outras camisolas. Melhorou muito, embora não o suficiente para impressionar Fernando Santos, que não o incluiu na última convocatória. Não é propriamente um drama, a Seleção tinha médios em ‘excesso’ e João Mário ficou de fora, como ficaram executantes de primeira água como André Gomes, Adrien ou Pizzi – sem esquecer Miguel Veloso, que fez mais uma grande temporada em Itália.
Certo é que o Inter, sabendo que irá perder toneladas dinheiro, procura diminuir ao máximo o prejuízo, algo para o que não pode contar muito com o Sporting, que decidiu – finalmente e bem – viver de acordo com a realidade. E os 3 milhões de euros que Frederico Varandas terá oferecido aos italianos é menos de metade do que os 7,5 milhões que LF Vieira parece disposto a gastar. Assim sendo, e apesar de qualquer dos rivais lisboetas lhe pagar o mesmo, João Mário não se dispõe a dizer que “em Portugal só jogo no Sporting” – sim, há o FC Porto, mas nessa altura andava de fralda – e quer apenas resolver a sua vida. E isso é natural. Como é natural que tema ser enxovalhado a toda a hora pelos que se sentem ‘traídos’ por um dia terem partilhado com ele os seus ‘sonhos de criança’.
O parágrafo final vai para um dos meus jogadores preferidos, o ainda campeão europeu Bruno Alves, que não aceitou um suposto convite para jogar no FC Porto B (?), e trocou a incompreensível ‘humilhação’ portista por uma época ao serviço do Famalicão, onde provará uma vez mais – como estão a fazer Pepe, Fonte ou Cristiano – que velhos são os trapos. Chapeau!
Outra vez segunda-feira, Record, 5jul21