O mercado editorial
português atravessa a crise do País: menos dinheiro para comida, menos
capacidade para investir nas
estantes. Sim, a expressão não é ingénua, ter edições na sala ou no escritório
não é sinónimo de predisposição para a leitura ou de vontade para apostar no
conhecimento. E é isso mesmo o que, faltando antes, leva hoje as pessoas a não
adquirirem livros – havendo outras prioridades, as prateleiras podem esperar.
Com a exceção de Lobo
Antunes e de mais dois ou três nomes de referência, quem queira vender papel
precisa de se expor, tem de estar na televisão ou ir lá muitas vezes. A
atração pelos famosos, verdadeiros ou aproximados, fictícios ou pouco
mais do que indigentes, transformou-se numa oportunidade de negócio que as
editoras procuram explorar na sua luta pela sobrevivência. Daí que a área
esteja entregue a pouco mais de uma dezena de autores, que conseguem vender
pelo que são, e por uma autêntica chusma de oportunistas, alguns totalmente
desqualificados, que aproveitam uma passagem, breve que seja, pela TV, para escreverem
– ou debitarem para gravadores, melhor dito – obras de quase nulo interesse
editorial, mas de provável utilidade comercial. E aceitam receber escassos
euros por exemplar vendido – verbas modestas que em muitos casos não chegam
sequer a ver – pela vaidade de serem olhados como escritores pelas
primas. Não vale a pena retorcermo-nos: é a realidade com a qual temos de
viver.
O livro de Fernanda Serrano,
constituindo um evidente aproveitamento da exposição mediática da atriz – que
se impôs na representação pelo talento, é verdade –, tem a vantagem do conteúdo
e da mensagem: o combate da ex-manequim contra o cancro, um incentivo para
todos os que se vejam obrigados a enfrentar a doença. Só por isso, a edição
seria meritória. O que se pode lamentar é que Fernanda tenha rejeitado, nos
últimos anos, insistentes convites para falar do seu drama, e muita gente haja, entretanto, sucumbido sem o
alento desse testemunho e o exemplo, de facto arrebatador, da sua coragem e
determinação. Mas, enfim, chegou o dia e antes tarde do que nunca.
Fica agora uma dúvida: o
lançamento de Também há finais felizes significará uma alteração do
áspero comportamento de Fernanda Serrano na relação com a imprensa que
acompanha a vida das estrelas? Será que a ousadia das câmaras da
TVI – estação de que é contratada– que na derradeira transmissão de A
tua cara não me é estranha nos mostraram as suas filhas, poderá ser
repetida pelas revistas cor de rosa? Ou prosseguirá a estafada política
da preservação da privacidade apenas para o que lhe convém? Acho que sei
a resposta.
Observador, crónica publicada na edição impressa da Sábado de 11 abril 2013. Tema de Sociedade da semana: o livro de Fernanda Serrano