Não vale a pena falar em revolução tática ou em alterações profundas para justificar a mudança de atitude – e consequentemente de resultados – da Seleção Nacional de Paulo Bento. E não vale a pena porque não é nada disso.
Desde logo, o novo selecionador não é bruxo. Nem sequer “chama” pelas forças do Além que tantas horas de aflição pouparam a Luiz Felipe Scolari. Depois, o ex-treinador do Sporting também não dispõe da auréola que adorna as cabeças dos grandes cientistas do futebol, aqueles pensadores de quem toda a gente diz maravilhas e que estão sempre contratados sem que se perceba muito bem porquê.
Como pôde então Paulo Bento, sem dispor de um arsenal – terreno ou extraterrestre – de envergadura, operar a grande transformação de uma seleção que não conseguia ganhar nem à Albânia e que passou a ser capaz de golear até a Espanha, campeã da Europa e do Mundo, e que dispõe de uma equipa formada pela fina-flor do Barcelona e do Real Madrid, ou seja pelo melhor que existe no futebol do Planeta?
Não há qualquer mistério. Paulo Bento apresentou-se aos jogadores com a mente lavada e as mãos limpas. Falou-lhes com a qualidade dos líderes que se impõem precisamente por aquilo que, escasseando a outros, outros trai: falta de vedetismo, ausência de prosápia, simplicidade nos processos e na comunicação.
Os feiticeiros da bola, podres de dinheiro, cansados de viagens, fartos de concentrações, têm nas seleções, por muito que o neguem, um rol extra de chatices. Precisam de encontrar quem lhes repare a mente mais que o corpo, quem lhes fale claro, quem não invente, quem não se distinga pela necessidade de auto-afirmação ou pelas excentricidades que logo resultam em asneira.
O resultado esteve ontem de novo à vista. A Seleção colocou a velocidade, o caráter e a determinação ao serviço da inegável classe dos seus jogadores. Aliás, Cristiano Ronaldo, no final, explicou tudo numa simples frase: “Nós queremos é continuar com o nosso trabalhinho”.
E que façam o seu trabalhinho é só o que queremos deles.
Minuto 0, publicado na edição impressa de Record de 18 novembro 2010