Não me lembro de uma campanha eleitoral, como a que ontem terminou, em que tenha sido tão visível, na generalidade dos canais, as simpatias e antipatias de quem editou as reportagens, fosse por opção individual ou por ordens superiores. Foi, aliás, fácil perceber como muitos jornalistas deixaram cair o poder que consideram passado e correram a engrossar o que julgam ser os ventos da mudança. Não é um fenómeno novo, a natureza humana é assim.
Vi num canal uma grande manifestação de um partido bater, de forma clara, em entusiasmo e afluência de apoiantes, o desfile de uma força política concorrente, e assisti depois, noutra estação, à demonstração do contrário. Esse “milagre” foi conseguido com o recurso a planos fechados que “reduziram” a multidão e à audição de contra-manifestantes, no caso do real “vencedor”. E com imagens seleccionadas de alegria “esfusiante” e declarações de apoio, na reportagem do “derrotado”. Os repórteres concluíram os seus trabalhos com palavras que não deixaram dúvidas de que a montagem das peças correspondia ao rigor das intenções.
Moral da história: os jornalistas são pessoas como as outras. E se a isenção é um dever, as excepções fazem parte da regra. É a vida.
Antena paranóica, publicado na edição impressa do Correio da Manhã de 4 junho 2011