Na hora do adeus
Foi uma luta longa e desigual contra um inimigo implacável que ganha sempre. Adormecida por décadas, a besta voltou para levar Marco Paulo para os braços da sua mãe. Intérprete único, de voz poderosa e dicção perfeita, era um homem de ego enorme, simplicidade cativante e coração de eterna criança.
Recuo a 1996 e à tarde em que Carlos Castro me deu a notícia do triste diagnóstico que o próprio Marco acabara de lhe revelar na sua casa de Sintra. Eu tinha chegado ao ‘Tal&Qual’ dias antes e estreei-me assim como coautor de uma manchete que chocou o país. Mas não pensei, então, que a resistência de Marco viesse a ser tão heroica – nem o fim tão cruel.
Quis o destino que os últimos anos de vida do cantor lhe pesassem menos, primeiro graças à iniciativa da SIC de lançar o ‘Alô Marco Paulo’ e depois ao espetáculo ‘Para sempre Marco’, criação brilhante de Tiago Pais Dias. Da hora do adeus guardarei as imagens do povo anónimo que o acompanhou à derradeira morada e a feliz ausência dos preconceituosos que nunca o suportaram e só fingiram aceitá-lo por não terem outro remédio. Que grande foste, Marco.
Publicado no Correio da Manhã de 2 novembro 2024