Vivemos hoje sob o signo do “alegado”, termo presente na mais simples notícia relacionada com um crime e cuja doentia utilização chegou já a pivôs de telejornal. A mania é tão poderosa que o adjetivo – “alegado” como sinónimo de “presumível” ou de “suposto” – já é aplicado com o substantivo “suspeito”, ou seja, alguém alvo de suspeita ou apontado como autor de algo. É verdade, leitor, fique atento e ouvirá falar, num qualquer canal, ou em vários, de um “alegado suspeito”, uma infeliz criatura suspeita de… ser suspeita.
Mas se a defesa – sagrada para um jornalista – da presunção de inocência, ainda nos pode levar a tolerar tal cuidado, que dizer do alargamento da ignorância quando, perante um crime violento, se qualificam as pessoas assassinadas como “alegadas vítimas”? Ter-se-ão assaltado e esfaqueado a si próprias? E enquanto se procura o autor do crime porque se lhe chama “alegado autor”?
Entendamo-nos: quando a polícia o procura, procura “o” autor do crime porque o crime não é alegado, aconteceu. E só quando o encontra – encontrando alguém que julga ter praticado o crime – ele se designa por “alegado autor”, passando depois, se for o caso, a arguido, a “acusado do crime” até decisão final dos tribunais.
Antena paranoica, Correio da Manhã, 2JUL16
O alegado suspeito de ter morto as alegadas vítimas
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