Eleito presidente há pouco tempo, Rui Costa pode e deve ser criticado pelo que faz e confrontado com o que cada um ache serem os seus erros. Mas tem também de se desviar permanentemente do fogo ‘amigo’ daqueles benfiquistas que gostavam de estar no seu lugar e não estão, aliás, por três motivos bem simples: a sua própria cobardia, a vontade dos associados do clube e a graça de Deus. Essa trupe inútil descobriu agora outra frente: o abraço a Pinto da Costa, que considera uma traição. É por causa de fanatismos desses que o futebol português vive no caldeirão de inimizade e violência em que ninguém ouve ninguém. E se um novo protagonista entra em cena e exibe uma postura diferente que possa abrir caminho a alguma concórdia, logo os soldados do ódio saltam ao terreno para que a estupidez sobreviva. Pura miséria.
E a propósito do que cada um acha: sou dos que entendem que Rui Costa devia ter atuado mais cedo, e mais firmemente, mal a confiança entre Jorge Jesus e os jogadores se perdeu. Ao deixar apodrecer o ambiente no Seixal, o presidente do Benfica permitiu que se desse aquilo que nunca pode acontecer numa empresa: os funcionários afrontarem, e na realidade acabarem por despedir, a pessoa que manda neles.
Com essa inércia, Rui Costa fez alastrar a indisciplina. E pior, somou-lhe a impunidade. Ao não ser sancionada, a feia atitude de Pizzi – que se saiba só contestou o líder quando o sentiu por um fio – incentivará novas ‘rebeliões’, mitigará a autoridade dos treinadores que vierem e envenenará por muito tempo os relacionamentos no Benfica. Temo que o ar só se torne respirável com uma série de depurações que, fatalmente, atingirá pulhas e inocentes.
Reproduzo palavras do jornalista brasileiro Raí Monteiro: “O Flamengo não teve uma boa experiência ao apostar em Domènec Torrent, quando Jesus foi para o Benfica, e por isso alguns torcedores desconfiam do que será essa nova aposta por Paulo Sousa”. E desconfiam bem, diria eu. Assinar um contrato de dois anos com um treinador cuja permanência num projeto varia entre os 19 meses no Videoton e os três (!) no Leicester é não ter amor ao dinheiro.
Pergunta sem resposta: será em 2022 que veremos acabar no nosso futebol os protestos em catadupa nos bancos, com toda a gente em pé, aos berros por tudo e por nada, bem como as fitas dos jogadores, tocados no peito ou no pescoço, que se rebolam no chão, agarrados à cara, como se tivessem levado com uma marreta e sentissem dores pavorosas?
Parágrafo final para Quique Flores e para o trabalho que desenvolveu em três meses em Getafe, ontem concluídos com uma bela vitória sobre o líder de La Liga, o Real Madrid. Quique tomou conta da equipa dos arredores da capital espanhola quando ela era última na tabela com 1 ponto – o único obtido em oito (!) partidas. Nos derradeiros seis jogos, o Getafe somou três vitórias e três empates, sofrendo apenas um golo. O entusiasmo do madridista que eu sou com o sucesso de Quique justifica-se pelo rastro de simplicidade e simpatia que deixou em Portugal, na sua passagem pelo Benfica. E há perfumes eternos. Feliz 2022, leitor!
Outra vez segunda-feira, Record, 3jan22